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CARMELOS
BRASILEIROS
Em 13 de fevereiro de 1947 foram sete
as carmelitas que partiram, do convento de Santa Tereza em São
Paulo, para Cotia.
Quatro eram conventuais do Carmelo de São Paulo, duas de
Mogi das Cruzes e uma postulante. A fundadora, Madre Verônica
de Verônica de Nossa Senhora das Dores e da Santa Face, requisitara,
do Carmelo de Mogi, Madre Raimunda dos Anjos para ser a primeira
Priora do Carmelo Cotiano. Com sua companheira Irmã Regina
da Imaculada Conceição prestou valiosos serviços
à fundação durante três anos, voltando
em seguida a seu convento de origem.
Naquela manhã festiva após as comoventes despedidas
de seu amado berço religioso, partiram as Irmãs, dirigidas
por seu Superior Dom Antônio Maria Alves de Siqueira, acompanhadas
de seus familiares, em automóveis superlotados. No da frente,
em que estava a Madre fundadora, ia, chefiando a piedosa caravana
e abençoando a fundação incipiente, uma grande
imagem de Nosso Pai São José. Sob sua proteção
bem como sob a de Santa Ana foi inaugurado o Carmelo do Imaculado
Coração de Maria e Santa Teresinha, nesta cidade,
cuja localização privilegiada é bem propícia
à vida contemplativa. Situa-se entre ondulações
verdejantes, em meio ao silêncio e uma bela e exuberante natureza.
O Carmelo está colocado no cimo de uma colina, como branca
sentinela a velar pelo bem espiritual da cidade situada no vale;
ao seu redor erguem-se montes atapetados com densas matas cujos
ipês se vestem de roxo e amarelo na primavera; nos dias ensolarados
divisa-se no horizonte a gigantesca capital paulista, contrastando
com as vilazinhas que se percebem dispersas, de longe em longe,
pela serra afora... É bem o local que Santa Teresa desejava
para seus Carmelos: largos horizontes, beleza natural, silêncio,
solidão! O clima ameno, a paz que se goza nessa região
solitária, o povo bom e simples desta cidade, que tem a glória
de contar entre seus filhos o célebre Senador Feijó,
contrastam com o burburinho estonteante de São Paulo que
fica apenas a 35kms de distância. São os próprios
moradores da Capital que vêm ao Carmelo pedir orações
ou visitar suas parentes enclausuradas, os primeirosa darem testemunho
da paz e tranqüilidade reinantes nestas paragens, paz inexistente
em outros lugares.
Mas como nasceu o Carmelo cotiano?
Nasceu do zelo pela glória de Deus e do desejo
de promover o bem das almas. Madre Verônica de Nossa Senhora
das Dores e da Santa Face, mestra de noviças no Convento
de Santa Teresa, recebera duas postulantes que completavam o número
máximo de Irmãs permitido pelas Constituições.
Surgiam, porém, muitos pedidos de admissão aos quais
não se podia atender por falta de vagas. Por essa época,
amargurava-nos a alma a fundação da Igreja Católica
Brasileira pelo ex-bispo de Maura. Com o desejo sicero de reparar
o cisma nascente, pedir a conversão do bispo e de seus adeptos,
foi-se concretizando a idéia da fundação de
um Carmelo onde seriam recebidas tantas almas generosas, desejosas
de doação a Deus na Ordem de Nossa Senhora do Carmo,
almas que fiéis ao espírito da Santa Madre Teresa,
numa exata observância do seu modo de vida, fossem de utilidade
para a Igreja de Nosso Senhor Jesus Cristo.
Ao terem conhecimento da idéia nascente tanto a Madre Priora,
Madre Margarida do SS. Sacramento, como a Madre Regina da Imaculada
Conceição, fundadora do Carmelo de São Paulo,
abençoaram-na e incentivaram-na vendo nela manifestada a
vontade de Deus, afugentando assim os humildes temores da fundadora
que receava ilusões e se julgava indigna de tão grande
empresa.
Conhecendo o projeto da fundação Dr. Caio Simões,
pai de uma das noviças, prontificou-se caridosamente a auxiliar
a manutenção da comunidade e de seu lado o Sr. Domingos
Assumpção Filho solicitamente pôs sua casa de
campo em Cotia à disposição das Irmãs,
adaptando-a, às suas custas, às necessidades de um
Carmelo regular. O Revmo. Padre Miguel Pedroso, então vigário
de Cotia, acolheu de bom grado a fundação, interessando-se
sobremaneira junto ao Sr. Domingos. Sua oportuna e caridosa interferência,
bem como seu zelo espiritual para que nada faltasse nesse campo
às Irmãs, muito contribuíram para a consolidação
do Carmelo cotiano.
Proposto de início o projeto da fundação ao
Sr. Cardeal Carlos Carmelo de Vasconcelos Motta, Sua Eminência
aprovou de bom grado, visto a manutenção da comunidade
estar garantida e encarregou Dom Antônio Maria Alves de Siqueira,
naquela ocasião Cônego Siqueira, do cuidado espiritual
do jovem Carmelo, tornando-se assim, Sua Excelência Pai e
fundador do Carmelo de Cotia.
Com as devidas licenças da Santa Sé, no trigésimo
aniversário das aparições de Nossa Senhora
de Fátima, surgia o Carmelo de seu Imaculado Coração
sob a invocação também de Santa Teresinha que,
sendo padroeira das Missões, concretizava na fundação
o profundo espírito apostólico e missionário
da Ordem. Este "pombalzinho da Virgem" como nossa Santa
Madre Teresa chamava seus carmelos, permaneceu por três anos
na fazenda São João e Graça, propriedade do
Sr. Domingos Assumpção Filho. Entrementes Dr. Caio
Simões comprou a colina popularmente chamada "Chumbinho"
junto à cidade e construiu a primeira ala do Convento. Assim,
graças à generosidade de tão caridoso fundador
guiado pela bondade infinita de nosso Deus, na festa de nosso Santo
Padre João da Cruz, a 24 de novembro de 1949, as Irmãs
tiveram a alegria de se trasladar para o Convento definitivo. Hoje
o Carmelo está completamente construído e a comunidade
vive num convento regular, com a pobreza da Ordem, sim, mas com
o necessário para seu desenvolvimento normal, humano e sobrenatural.
Ser Carmelita
A vida carmelita é um sinal escatológico
erguido em meio ao mundo de hoje. É um vivo testemunho das
realidades sobrenaturais! Por que jovens, cujo futuro sorria de
esperanças, abandonaram as alegrias de um lar cristão
e todos os valores positivos que a vida no mundo lhes poderia oferecer,
como uma carreira brilhante, muitas vezes de grande projeção
na sociedade, para se trancarem atrás das grades?
É uma pergunta que se ouve com freqüência. Por
que religiosas cultas, que poderiam ser úteis no apostolado
ativo, limitam-se apenas à oração? Se até
sacerdotes não compreendem a vida do Carmelo, não
admira que cristãos pouco esclarecidos menosprezem a vida
comtemplativa, supervalorizando o apostolado ativo como se fora
o único meio eficaz de promover o bem no mundo. É
justamente de oração e imolação que
o mundo precisa: as duas mãos postas que alcançam
de Deus as graças para a humanidade!
A resposta a essas perguntas é o próprio Concílio
Vaticano II que nô-la dá conservando e revitalizando
a Vida Contemplativa: "Os Institutos religiosos inteiramente
votados à contemplação..., não obstante
a urgente necessidade do apostolado ativo, conservam sempre um lugar
bem eminente no Corpo Místico..., em verdade, oferecem a
Deus um excelente sacrifício de louvor e, produzindo abundantíssimos
frutos de santidade, honram e edificam o povo de Deus ao qual dão
incremento com misteriosa fecundidade apostólica. Constituem
destarte uma glória para a Igreja e uma fonte de graças
celestiais".
O Carmelo é um testemunho vivo de fé, de esperança
e de caridade. Dizia-nos o Revmo. Padre Luís Martini, preclaro
vigário de Cotia: "As senhoras, só por existência,
dão provas de que Deus existe e que há uma vida eterna...
Se não fosse assim quem se sujeitaria à vida enclausurada?"
É, portanto, um grito de alerta aos homens de hoje indicando-lhes
que nesta vida tudo é transitório, que Deus nos espera
como o melhor dos pais e nos convida a um doce comércio de
amor com Ele, na oração!
A vida carmelita é a oração e isso ela se envolve
de silêncio, procurando o retiro da cela, onde se ocupa em
trabalhos manuais, que lhe deixem a mente e o coração
livres, para que possa atender a Deus só. Tanto na cela como
nos ofícios da sua vida comunitária, a carmelita é
recolhida e aplicada à oração contínua
e, para que Deus seja tudo em sua vida, ela se imola por amor, na
aceitação humilde e agradecida das penas da vida,
no cumprimento fiel do dever e na prática de todas as virtudes
religiosas.
Por que, desconhecido do mundo pluralista que o cerca, o Carmelo
é muitas vezes atacado ou pelo menos incompreendido? Levantam-se
contra ele suspeitas de penitências macabras como a de cavar
a própria sepultura à noite, de macerações
desumanas e humilhações degradantes. Nada mais injusto
e sem fundamento. Sua vida é austera, não há
duvida, mas nada disso existe! Há, sim, o sacrifício
perene do despojamento que liberta a alma dos defeitos da natureza
decaída, há a observância fiel de uma regra
que comporta o jejum, longas orações, abstinência
perpétua, silêncio, solidão, pobreza e trabalho,
mas há também o exercício da caridade fraterna,
da união dos corações que torna o ambiente
feliz: uma família unida onde reina simplicidade e alegria,
caridade e paz. Quanto mais mortificada a carmelita tanto mais alegre
será e mais aberta com suas irmãs. Dão provas
disso as duas horas de recreação que temos por dia
após as refeições. Se o mundo pudesse ver,
certamente invejaria a alegria espontânea dos nossos recreios,
a inocência das brincadeiras e o riso cristalino de almas
que o peso dos anos não tornou-lhes velhas, e as privações
e os sofrimentos não tornaram tristes.
E isso porque no Carmelo vive-se plenamente o Evangelho! Os ensinamentos
de nossa Matriarca Santa Teresa de Jesus, de nosso Santo Padre João
da Cruz, doutores da Igreja, traçaram claramente o caminho
espiritual para seus filhos atingirem a mais alta perfeição
de vida evangélica!
O preceito central da vida carmelitana é a oração;
por isso, além da santa missa diária, temos duas horas
inteiras de oração mental em que, no colóquio
pessoal com Deus na maior liberdade de espírito, a carmelita
vive já na felicidade da vida eterna, e isso sem falar no
Ofício divino ao longo do dia, isto é, a recitação
coral do Breviário, onde vamos haurir as águas cristalinas
da contemplação em suas próprias fontes: os
salmos e demais textos escriturísticos. A leitura espiritual,
os exames de consciência, a recepção dos Sacramentos,
tudo enfim é ordenado ao adiantamento da alma na vida de
união com Deus, tendo ainda a carmelita possibilidades, no
seu tempo livre, de entregar-se às devoções
particulares mais caras - poucas mas sólidas - o rosário
de Nossa Senhora, a visita ao SS. Sacramento e a meditação
dos sofrimentos de seu Esposo na Via-Sacra. O grande amor de toda
carmelita é a Nossa Mãe Santíssima do Carmo;
a devoção marial é uma das notas características
da vocação carmelitana, bem como a devoção
ao Menino Jesus e ao nosso Pai São José. No exercício
da presença de Deus a carmelita pode fazer seu aquele grito
de Elias: "Viva Deus em cuja presença estou!" O
silêncio de nossos claustros é cheio dessa presença
invisível mas real e consoladora de nosso Deus: inesgotável
riqueza na ausência de tudo!
O zelo da carmelita é constantemente alimentado pela vida
de oração. Ela vive e reza, sofre e trabalha, não
para si, mas para toda a humanidade principalmente pelos defensores
da Igreja, pelos pregadores e sábios que a sustentam, pelos
sacerdotes e missionários, para que aumentem em número
e fervor e trabalhem eficazmente na salvação das almas.
"O menor movimento de amor é mais útil à
Igreja que toda obra reunida" ensina São João
da Cruz! A vida do Carmelo é humilde e simples, escondida
aos olhos de todos, mas é uma chama ardente para Deus sem
se desinteressar pelo mundo.
Na simplicidade dessa vida em comum, cada uma se esforça
por trabalhar de maneira a ganhar também para o sustento
das outras. Fazemos todo o serviço de uma casa, desde a limpeza,
cozinha, costura, lavagem de roupa, até criação
de galinhas, jardinagem, horticultura, além de outras encomendas
que recebemos para, como pobres diligentes, ganharmos o pão
de cada dia, conforme prescrevem nossa Regra e Constituições.
Nesse campo muito variado são utilizadas as habilidades e
aptidões de cada irmã: bordados, confecção
de paramentos, ornamentos para o culto divino, hóstias, velas,
pinturas, tricôs e outros trabalhos de agulha, traduções
e revisões de livros, trabalhos de datilografia e mimeógrafo,
até quitutes e ornamentação de bolos, para
sermos úteis às famílias que nos cercam e que
recorrem às carmelitas em suas dificuldades. Todos os cotianos
já sabem que as irmãs estão prontas para servi-los
e assim nos trazem imagens espatifadas para consertar, flores para
fazer, cartazes para ornamentar e distintivos para confeccionar.
As irmãs, numa caridosa colaboração, estão
sempre prontas para atender, (desde que não prejudiquem o
espírito e a vida de oração, seu primeiro dever)
é uma modalidade de nossa abertura para o mundo, pois todos
sentem que a carmelita é como uma irmã a seu lado,
sempre disposta a ser útil aos outros. Quanto mais voltadas
para Deus, tanto mais amamos a todos os nossos irmãos. Assim,
nossa clausura longe de ser uma expressão farisaica de uma
repulsa do mundo, é, antes de tudo, um belo sinal de um melhor
encontro com este mesmo mundo, no regaço e sob o olhar do
próprio Deus. "Não se fala de Deus aos homens,
mas fala-se, e muito, dos homens a Deus".
As nossas grades, proteção de nossa clausura, são
como a cápsula para o astronauta, ou antes, como uma plataforma
que nos lança no mundo misterioso do espírito; como
o astronauta retira-se da companhia dos seus e prepara-se longo
tempo por exercícios apropriados para o vôo espacial,
assim a carmelita afasta-se para o lugar deserto, enclausura-se
abraçando exercícios apropriados de amor a Deus, despojamento
de si, desprendimento de todo o criado para arrojar-se, pelo bem
da humanidade, ao mundo espiritual até o coração
de Deus, de onde alcançará inumeráveis graças
de que os homens tanto necessitam: a luz da fé e da verdade,
o alívio para suas angústias, e estímulo fraternal
nos seus reveses, a solução para seus problemas materiais
e espirituais e, finalmente, sua eterna salvação.
Porque ama a Deus, a carmelita ama e sofre por seus irmãos.
Com Santa Teresinha pode repetir: Compreendi que o AMOR encerrava
todas as vocações, que o AMOR era tudo, que abraçava
todos os tempos, todos os lugares... numa palavra, que ele é
eterno. Minha vocação, enfim, eu encontrei: no Coração
da Igreja, minha Mãe, eu serei o AMOR".
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